Catarina Bento, Diaca

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A minha mãe morreu quando eu era pequena. Levaram ela lá de Maca para Tanzânia, morreu com doença de Tuberculose. O meu pai morreu quando eu tinha 6 anos. Cresci com o meu tio. Vivi assim mesmo, a conviver com uma pessoa que não me viu nascer. Alguns dias vivia bem, outros dias vivia mal, no meio de palavrões, mas assim mesmo fui vivendo até crescer. 

Quando os Al-Shabaab chegaram em Diata, queimaram a casa do chefe do posto, o hospital e algumas das nossas casas. Não levaram nenhum de nós porque os chefes já nos tinham avisado que era melhor fugir. Carreguei os meus filhos pelo mato, mas durante o caminho, o avião estava a disparar muito e com a confusão, perdi dois deles. Toda hora estava a chorar. Tentava procurar, mas não os encontrava.

Éramos muitas pessoas no grupo, dali cada qual escolhia a direcção que ia levar, onde podia ir para viver. No lugar onde eu fiquei, em Awasse, depois de um tempo também fomos avisados que os Al-Shabaab estavam a chegar, então mais uma vez fugi. As famílias saíram de lá unidas com água no galão, um pouco de farinha, sal e peixe seco. Quem tinha arroz, comia arroz, quem tinha mandioca seca, comia xima de mandioca, quem tinha xima branca, comia xima branca.

Antes de partir, vieram-me chamar. Convocaram uma reunião na escola e mostraram-nos um grupo de crianças. Havia muitas crianças, outras eram bebés, estavam a gatinhar. No meio delas, vi o meu filho e comecei a chorar, ele quando me viu foi a correr, “Mamã, mamã, mamã!”. Epá, eu não esperava encontrar o meu filho depois de dois meses.

Foi pela ajuda do meu tio que chegámos a Metuge. Ele ligou para um amigo e disse, “Eu tenho uma sobrinha deslocada, de nome fulana, vai procurar por ela aí no centro”. Esse amigo dele veio no centro, me encontrou. Procurou saber de mim, “Agora daqui vai para onde?” Eu disse, “Não sei”.  Então, foi quando ele disse que o meu tio estava em Pemba, que me podia levar lá.

Em Pemba, o meu tio não tinha como me abrigar, ia só dar-me uma ajuda só. Ele entregou-me ajuda de 200 Meticais e eu fui para Metuge, onde me emprestaram a casa de alguém e comecei a viver em Taratara e dali tive apoio de comida de PMA. Uma das vezes que eu recebi apoio de PMA, tive arroz, feijão, namahuta, óleo, mas entrou ladrão e roubou toda a nossa comida. Naquele mês, eu sofri muito por não ter nada para dar às crianças… Fazia matapa, sem xima, sem arroz, sem nada, dar às crianças para comerem assim mesmo.

Então, dali me perguntei, “Vou emprestar casa até quando?” Foi quando vim no centro para ter apoio do governo. E quando eu vim aqui neste centro, quando cheguei aqui, me ofereceram tenda onde estou a viver até hoje. Estendo capulana aqui e durmo com as crianças. Tenho amigas, uma velha amiga que tem sentado comigo e outra que é família. No centro, sou a única Maconde, me sinto sozinha, o que eu gostaria é de voltar para casa, mas essa guerra está a começar novamente. 

Essas senhoras é que me apoiam, “Não pode chorar, isso é guerra, na guerra tudo acontece. Há que ter fé, se até agora não tens notícias que morreu, com certeza deve estar viva, tenha lá fé”, eram essas as palavras que me acalmavam. Estes dias vieram-me informar que a minha filha desaparecida está a vir para aqui. É um milagre! Estou grata porque, nesta guerra, muitos ainda não tiveram a sorte de encontrar os seus familiares.