Tima Bakar, Macomia

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Vimos pessoas de caras estranhas e nós fugimos. Recrutavam crianças, adultos, mulheres e raparigas para casar, homens para treinar com armas. Na nossa zona, foram recrutados homens que trabalhavam nas machambas distantes, onde o governo proibia ir. Nessas terras proibidas, começámos a encontrar pessoas mortas, e vimos que o caso era grande. Foi quando a guerra se espalhou em toda a zona de Macomia.

Eu sou líder da comunidade aqui no centro. Disseram que já não queriam mais um homem, queriam uma mulher, todo o mundo me apontou. Eu me escondi, é muita responsabilidade, mas eles disseram, “Deve ser essa senhora, ela lê um pouco, e faz serviço do Governo, queremos que seja nossa líder, aqui dos deslocados”. Então, tomei posse naquele dia. É assim que estamos a tentar mudar as coisas.

Quando chegámos aqui, a comida não chegava às nossas pessoas, chamavam os nomes dos donos da aldeia, não dos refugiados de guerra. Queixámos três vezes, não fizeram nada, até que acabámos por falar com a Administradora, relatando toda a situação de que os donos da terra têm tudo nas suas casas e nós não temos nada, mas eles recebem e nós não. Agora isso mudou, escrevem os nomes de cada agregado familiar e temos comida.

Os paus para construir, cortamos sozinhos. Dissemos ao Governo que não nos ajudaram, nem a construir casas, nem casas de banho, agora pelo menos estamos a pedir lonas. Saiu o chefe do posto e disse para irmos ao mato tirar capim para cobrir nossas casas. Eu perguntei, “Será que nós não somos refugiados, outros são apoiados e nós não, qual é a diferença?” Não respondeu. Nós ainda não recebemos nada. Nem lona, nem candeeiro, nem tampas de latrinas, nada, recebemos sempre pessoas que fazem promessas, por isso outros estão a voltar, a dizer, “Vale a pena morrer nas nossas casas!”

Dizem que os militares do Governo foram num sítio e colocaram veneno na água dos Al-shabaab e eles estão morrendo como cães. Mas os únicos militares que estão a fazer grande trabalho são esses que vêm do Ruanda, se não fossem eles nós não estaríamos ainda vivos. Eles têm várias formas, têm mapa, têm avião e colocam o inimigo nas armadilhas. Eles estão a trabalhar bem.

Esses terroristas são monstros. Recrutam e te treinam e voltam a invadir a sua zona para matar sua mãe, seu pai, irmãos, irmãs e todos os membros da família. Dizem que somente dessa forma você aprende. Às vezes perguntam sobre a religião, quando você diz que é muçulmano está tudo bem, mas quando diz que é cristão e Maconde dizem, “Cortem! É irmãozinho de Nyusi, esse. Se um dos companheiros chorar, levem para matar também.”

Para esquecer tudo isso, dançamos Nihapo, dançamos Tufo, também jogamos damas, crianças jogam futebol. É assim que tiramos os pensamentos maus da cabeça.

Estou a pedir paz, as pessoas estão a sofrer. Eu gostaria que essa guerra acabasse, para construir minha casa, porque tinha mota, bicicleta, televisor e muito mais, mas perdi tudo e gostaria que voltasse a recuperar tudo o que perdi.  Quero paz somente.